O pestinha da excursão




A situação contada aqui tem jeito de piada, mas não é. Aconteceu de fato.
Eu e minha família nos metemos numa excursão de amigos para uma cidade do interior paulista com destino a uma colônia de férias serrana.
Como se tratava de um grupo de amigos, a disposição dentro do ônibus era a seguinte: os adultos todos na frente, a meninada do meio para trás e, nos últimos assentos, os mais bagunceiros. O ônibus possuía um banheiro cuja porta estava com defeito, não trancava. Ela se abria o tempo todo e ficava batendo.
Saímos bem cedo e a viagem se iniciou alegre. Muitas conversas, a garotada puxando música, os gaiatos gritando coisas engraçadas, muita diversão.
Com o passar das horas, um sossego se fez.
O ônibus começou a subir uma serra por estrada íngreme e de muitas curvas. E a porta do banheiro abrindo e fechando, batendo pra cá, batendo pra lá.
Num certo momento, os bagunceiros resolveram espantar aquela modorra e provocar um dos meninos, justamente o famoso pelas perversas traquinagens, o mais atentado dos moleques presentes.
Começaram com tapas na nuca dele. Tapas, tapas, tapas. Ele reclamando até sair de onde estava para distribuir cascudos nos rivais. Alguém falou uma gracinha e lá foi o moleque para o ataque. Na verdade, ele estava adorando aquilo.
Só que a coisa foi num crescendo.
O encapetado de pé diante da porta do banheiro distribuindo socos, pontapés, cascudos em todas as direções.
A molecada rindo, provocando e se esquivando.
Virou uma perturbação.
Os adultos, indignados com aquilo, se viravam para trás. A mãe do garoto esticou a cabeça e gritou:
“Meu filho... Não faça isso. Volte para o seu lugar.”
Ele fingiu obedecer. Sentou-se. Ela pareceu acreditar e tornou a apreciar a paisagem.
As provocações voltaram com força.
E a porta do banheiro batendo.
O organizador da excursão, um militar reformado, levantou-se e repreendeu:
“Vamos acabar com essa bagunça aí atrás.”
Todos se aquietaram. O capetinha se escondeu por detrás de um encosto com a cara mais sonsa do mundo. Esperou uns minutos para dar uma cusparada no amigo do banco da frente. E a repetição dos cascudos, tapas e gritos.
De repente, a mãe se levantou e veio atravessando o ônibus.
Expectativa. Todos estavam certos de que o filho receberia uma boa reprimenda.
Ela parou junto dele e disse quase sussurrando:
“Pare com isso. Todo mundo lá na frente está zangado. Não quero me aborrecer, viu?”
“Tá bom, mãe.”
“Preciso que você tome conta da porta, que eu vou ao banheiro”, pediu ela.
Ela entrou naquele compartimento. Ele se postou para escorar a porta com os olhos concentrados nos companheiros de algazarra com um sorriso nos lábios.
Vendo-o daquele jeito, impossibilitado de desencostar, atiçá-lo seria uma maravilha.
Alguém esticou o braço ameaçando dar-lhe tapa. Ele reclamou. Não dava para revidar.
Outro se aproximou e repetiu o mesmo gesto. E o capetinha sem poder fazer nada.
“Pô! Assim não vale. Espera minha mãe sair.”
 E vinha um, vinha outro, todos na provocação. Ele não aguentou.
Abandonou a porta e partiu enfurecido pra cima da galera descarregando seus socos.
Aquilo fez com que todos no ônibus se virassem novamente para ver.
“Esse garoto não sossega”, reclamou uma senhora.
Nesse instante, o ônibus iniciou uma longa curva, uma curva bem fechada, e a porta do banheiro se abriu. A mãe do menino foi cuspida lá de dentro com as calças arriadas até os pés. Ela se agarrou ao encosto de uma cadeira, suas partes íntimas a mostra.
O ônibus fez uma imediata curva contrária e ela foi jogada lá para dentro de novo.
Todo mundo viu. Um constrangimento. Comentários e risos velados.
O garoto reassumiu seu lugar na porta.
Passou-se um bom tempo até o trinco se mexer.
Ele recuou, ela saiu, olhou-o com muita raiva e avisou:
“Depois nós vamos ter uma conversa.”
E foi atravessando o ônibus de volta com o rosto rubro de vergonha.
Antes que a mãe alcançasse seu assento, que era o primeiro, o pestinha quis conferir o banheiro. Entrou e gritou num alto e bom som lá de dentro:
“Pô, mãe! Você mijou a tábua toda!”

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