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Mostrando postagens de fevereiro, 2016

A vizinha da janela: folhas secas

Eu, pelado no quintal, examinava os vasos de plantas, balançava um, balançava outro. No prédio ao lado, a vizinha e sua mãe meio cega e surda acompanhavam meus movimentos com curiosidade. Até que a mais nova perguntou: “O que você está fazendo?” “Estou retirando as folhas secas. Seguro no caule e sacudo”. Aí a velha: “Como é? Segura no caule e...” “Sacudo”, respondi, aumentando meu tom de voz. Imediatamente, a octogenária disparou lá para dentro e voltou ajeitando um binóculo nos olhos apertados.  "Sacudo, é????? Preciso ver isso!!!!!"

A vizinha da janela: falta d'água

Eu, pelado no quintal, a balançar a mangueira, sacudindo, rodopiando... Nada. Não subia. Não subia nem por um decreto. Falo da água que deveria estar subindo para caixa d’água do sobrado. Da janela do prédio em frente, a vizinha e sua mãe octogenária me observavam, as duas na maior secura. O abastecimento no bairro andava ruim, mas tudo parecia ter se normalizado nos últimos dias ali pelas redondezas. Porém, do meu humilde chuveiro, um pingo tremelicava sem cair. A velhota, apesar de se dizer cega, mirava certeira como um lince o pingolim a balançar. Confessou que já encarara enoooormes racionamentos, alguns de durabilidade impressionante. “Deve ser uma bobagem, meu filho. Procure mexer na sua torneira com cuidado. Se quiser, nós duas vamos aí pra examinar seu cano”. E antes que eu dissesse algo, ela, já soltando a dentadura da boca, continuou: “Eu faço a chupeta, minha filha solta a rosca e você enfia a carrapeta”.

A vizinha da janela: família

Eu pelado no quintal mexendo nos vasos de plantas, a vizinha na janela de olho na minha pimenteira, comentei sobre a questão do pré-sal, da expectativa de tumulto por causa do leilão. Ela me respondeu dizendo que tinha Leilão sob controle. Gritou lá para dentro e eis que surge alguém com modos abrutalhados que, de pronto, não identifiquei o sexo.  "Essa é Leilão, minha prima", apresentou. "Tá cuidando da minha poupança e tá penando pra me tirar do vermelho". Segundos depois, surgiu o rapazote de olhos gulosos que eu já conhecia, sempre atento às minhas qualidades, filho da minha vizinha.  R apaz letrado, gestos delicadinhos, reclamou que ainda não tinha dinheiro para ir aos States ver o show da Lady Gaga antes de se operar. Nem quis perguntei sobre a tal operação. E o mimoso foi logo se oferecendo para vir aqui e me mostrar a coreografia da Beyoncé. Sua mãe, contrariada, o interrompeu, mandando-o para dentro com a prima sapatão.  "Não repare. Esse menino

A vizinha da janela: o panelaço

Ontem durante o panelaço, eu pelado no quintal, e a vizinha me aparece na janela, doida pra participar daquele evento cívico. Ela, que andava inconformada com o carnaval, por não terem dado títulos às suas escolas favoritas – não deu pros Inocentes de Belford Roxo, não deu Curicica, não deu o Cubango, não sentiu o frenesi da Mangueira entrando - disse que está muito PT da vida com o governo. Com receio de arranhar seu jogo novo de panelas, me mostrou sua bojuda cabaça. Arreganhada no sorriso, agarrou com fúria o pau de uma colher e, com força, estourou a cabaça. 

A vizinha da janela: carnaval

Eu, completamente desnudo, ainda sob o impacto da vitória da verde e rosa no carnaval, aguava minhas plantas, quando a vizinha surgiu na janela também pelada, mas usando um turbante afro.  Estranhei aquela novidade, mas minha conhecida achegadeira se gaba de ser diferente, original, apesar de usar a denominação Guarani-Kaiowá no Facebook e colorir de “bleu, blanc, rouge” sua foto de perfil. Também não gosto de ficar imitando por aí. Ela, com o olho gordo na mangueira que eu segurava, acenou num gesto de braços que me lembrou Maria Bethânia e me perguntou: “Quando você olha pra mim, você vê mais peito ou bunda?” “Vejo talento”, respondi rápido com a borracha ereta a esguichar. E ela gritou: “Ajayô!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!”