Esqui na Quinta
Assistindo
pela TV esses esquiadores descendo morro abaixo, recordo que já fiz coisa
parecida, só que não no gelo de Sochi, mas na Quinta da Boa Vista.
No
lugar dos esquis, sandálias franciscanas.
Também
vivi a emoção de pilotar um carrinho de rolimã numa ladeira do Méier, me lançar
em tubo-água de parques aquáticos, botar o coração pela boca numa montanha
russa do Tivoli e sair batendo o traseiro nas ondulações de um tobogã em Cabo
Frio, de mãos dadas com minha amiga Janeth que, de tão apavorada, foi deixando
um rastro de urina pela descida.
Nesta
manhã de sábado, peguei minha bicicleta e fui até a Quinta da Boa Vista
recordar os piqueniques em família que fazíamos ali. Eu era uma criança e os tempos eram outros.
Muitas
famílias faziam o mesmo, estendiam suas toalhas para espalharem nelas os
sanduíches, garrafa de suco, água, bolo e frutas. Eu e minha irmã saíamos
correndo pelo gramado, subindo e descendo as elevações, jogando miolo de pão
para os peixinhos no lago.
Bem
perto de onde ficávamos havia uma gruta. Certo dia, resolvemos conhecer. Dois
escoteirinhos entraram na nossa frente. Seguimos.
A
caverna ia subindo, subindo, se estreitando. Muita umidade. Um mau cheiro
danado.
-
Puxa vida... Fazem isso aqui de banheiro.
Num
certo ponto, o caminho curvava para a direita. Dali para frente, descida. Estava
escuro e pouca coisa se via. Os escoteirinhos, para provar que eram corajosos,
quiseram encarar e seguiram naquele breu. De repente, escutamos seus gritos e
entendemos. Apesar dos sapatos de borracha que usavam, escorregaram. Foi um
tibum. Desceram desabalados, deslizando de bunda até a saída lá embaixo. Eu e
minha irmã paralisamos.
-
E agora? A gente vai cair também. Deve ser limo. Melhor voltar.
-
Nada. Vamos com cuidado. A gente consegue.
Fui
pisando cauteloso naquele chão incerto com minhas sandálias franciscanas, minha
irmã agarrada nas minhas costas. Um cheiro de fezes insuportável. Num certo
momento, começamos a patinar igual como se estivéssemos no gelo e iniciamos a descida.
Descemos escorregando, tentando um equilíbrio, quase caindo. Até que alcançamos
a saída. Foi um milagre não termos nos espatifado. Logo, tive a sensação
desagradável do melado por entre meus dedos e conferi. Não era limo nem lama.
Minhas sandálias pretas tornaram-se completamente marrons. Veio-me o engulho.
Minha irmã na mesma situação.
-
Eca... Vou vomitar.
-
Eu também. Precisamos achar uma bica para nos lavarmos.
Havia
mesmo uma torneirinha alguns metros dali. Tentei correr, mas meus pés
escorregavam dentro das sandálias. Um horror. Quando finalmente fazíamos a
lavagem e eu colocava para fora um sanduíche inteiro de mortadela, escutamos o
som de gente também regurgitando. Eram os escoteirinhos apoiados numa árvore, muito
acabrunhados com as costas de seus uniformes completamente imundiçadas. Todos
uns esquiadores de...
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