Presentes para mamãe
Alguém se lembra dos primeiros presentes que deu para
sua mamãe?
Sei que a data é comercial e até me revolto com o
bombardeio desvairado da mídia, mas é impossível não se envolver de alguma
maneira com a situação, uma vez que a marcação no calendário se reporta às
nossas progenitoras. E mães, assim como todo mundo, fingem, negam, mas adoram
presentes.
Saio pelo shopping lotado de gente enlouquecida,
buscando algo diferente, algo que surpreenda, sem me seduzir por produtos do
momento, todos com ofertas nada animadoras. Em anos anteriores, foram blusas,
bijuterias, livros, pêndulos exotéricos, lanterninha para velas, um
porta-retratos digital, ralador em forma de dançarina, um São Jorge de camurça,
cds de Roberto Carlos, Fafá de Belém, Alcione... Sem contar as
casinhas-luminárias de minha autoria.
Entro numa loja de cosméticos e a vendedora irradiando
alegria pergunta se quero “uma ajudinha” e vai logo me oferecendo um pacote
lindamente embrulhado com sabonetinhos e cremes para as mãos pelo módico valor
de 260,00. Em seguida, sugere um frasco em formato de coração com essência de
melancia ou maçã “que sua mãe vai amar” pelo precinho de duzentos reais
disfarçado de 199,00. Acompanho seus oferecimentos e, na medida em que não
mostro reação, ela esmorece na alegria, enquanto aponta opções que vão caindo de
escala. Interrompo nos 87,00, agradeço e saio sem prometer voltar. Resolvo
finalmente a questão numa livraria, comprando o recente da Lya Luft. Penso que,
aliviado, a próxima data será o dia dos namorados e eu estou solo. Dever
cumprido.
Volto para casa repetindo a frase “Lindo livro novo da
Lya Luft” só para testar se não travo a língua – coisa de doido - e,
inexplicavelmente, a música “Mamãe” se impregna na caixola. Sim... Já a
presenteei com o disco do Agnaldo Timóteo, linda composição do Herivelto
Martins e David Nasser que começa com “Ela é a dona de tudo, ela é a rainha do
lar, ela vale mais para mim...” Porém, sempre me incomodo com a parte em que
diz “Eu te lembro, o chinelo na mão, o avental todo sujo de ovo...” Minha mãe
não era megera de ameaçar nem de se emporcalhar de tal jeito. Enfim... Nunca
mais vi o disco, assim como outros. Já os imaginei guardados nalgum cofre
secreto de presentes.
Lá estariam também os primeiros, todos confeccionados
por mim na escola: a imagem de Nossa Senhora em gesso que envelheci e cobri de
verniz brilhoso, um desenho em giz cera, a caixinha que montei usando cartolina
e celofane com florzinha dentro, um coração de papel camurça que se abria, com grampo
para se prender na camisa.
Hoje sei que não há cofre algum, mas que os presentes
estão guardados, isso eu sei.
Acho que sei onde estão.
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