Calopsitas, papagaios e galinhas temperamentais



Fui até a casa do amigo Johnson Mayer, onde parentes e amigos comemoravam com alegria e música o seu aniversário, e me deparei com uma calopsita levada pela filha dele. Alguns experimentaram desfilar com aquela ave no ombro. Eu até pensei a respeito, mas achei melhor não arriscar, evitar um beliscão.
Lembrei-me imediatamente de um domingo, carnaval de 2009, quando encontrei uma amiga na Praça São Salvador toda feliz com sua calopsita. O bicho, acostumado solto, se comportava com tranquilidade no meio do agito dos foliões.
Tenho pena dos animais que são criados aprisionados. Não gosto de aquários, tampouco gaiolas. Uma amiga, que comunga da mesma opinião, um dia, herdou da irmã um papagaio. Não teve coragem de prendê-lo. Acostumou-o a viver solto no apartamento. Até aí, tudo bem. A questão é que o bicho lhe tem verdadeira paixão e detesta quem dela se aproxime. Ataca. Logo, ela não pode receber visita de ninguém.
Em viagem à Cumuruxatiba, conheci um comerciante de frutas e verduras que mantinha um papagaio solto circulando pela loja. Aquele curioso bicho também tinha suas manias e detestava mulheres. Era só uma delas se aproximar que ele se arrepiava todo e vinha querendo bicar. Mas adorava ser acarinhado por homens. Deixou-se ficar no meu braço e permitiu que eu lhe coçasse a nuca. Fechou os olhinhos de satisfação.
Naquela mesma localidade, durante exaustiva caminhada por longas praias de falésias, parei num casebre para pedir água. A moradora, uma senhora magra e bem enrugadinha, serviu-me coco. Enquanto eu sorvia o líquido, percebi os seres que me rodearam, ávidos por algo que eu pudesse lhes oferecer.
Eram gatos, cachorros e... galinhas. Galinhas mui miúdas.
Quando viu que eu havia bebido tudo, a senhora tomou-me o coco e o partiu em dois com uma peixeira e alguns floquinhos brancos se espalharam pelo chão.
Foi nesse instante que eu vi o improvável: galinhas desesperadas caindo ferozes em cima daqueles pedaços de coco, disputando com cães e gatos a comida, dando bicadas neles. Não sabia que galinhas comiam coco. Acho que, naquele caso, era uma questão de necessidade, de sobrevivência. Se ali estivesse minha amiga Luiza Dorotéia, aquilo comprovaria sua tese de que as galinhas são seres agressivos. Esse é o motivo que a faz não comer nunca frango. Um tio meu também deixou de comer, mas não por essa razão. Porque o pintinho que ele ganhara e criava com carinho, um dia cresceu e foi parar na panela, levado pela nova cozinheira desatenta.
Pobres galinhas. Chamá-las de agressivas...
Um tempo atrás, o Ziraldo mostrou na TV a passividade de uma galinha, ao apoiar seu bico no chão e, a partir dele, traçar um risco reto de giz.
Ela fica imóvel, completamente paralisada.
Mas voltando ao casebre de Cumuruxatiba. Estarrecido com a ânsia das galinhas, despedacei o coco todinho e deixei que se refestelassem naquele chão batido.
Querendo agradar, a senhora ofereceu-me uma caneca cheia de uma mistura. Era um farelo de coco com açúcar. Provei com uma colher. Muito gostoso. Quando já ia dando a segunda colherada, notei um garotinho bem magrinho chegando. Olhou para mim, reconheceu a caneca e seus olhos se encheram d’água.
“Isso aí é meu.”
Era o neto da senhora. Ela logo tratou de repreendê-lo:
“Boca calada, moleque! O moço é visita. Depois eu faço mais pra você.”
Fiquei arrasado, morrendo de pena. Além dele, as galinhas, os cachorros, os gatos e um cabrito, todos com a atenção voltada para a caneca.
Não tive coragem de comer mais qualquer migalha. Entreguei depressa aquele recipiente plástico na mão do menino que saiu correndo com a bicharada toda atrás.
Nunca mais vou me esquecer daquele dia.

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