A índia do metrô


Fazia tempo que eu não saía para pedalar, uma prática que adoro e que me ajuda a afugentar qualquer melancolia, essa tristezinha que dá na gente, aquela vontade de conversar com alguém, pedir colo. Bicicletar ajuda muito.
Uma tarde linda se fez pela orla, um friozinho gostoso.
Terminado o passeio, embarquei no metrô de volta à Tijuca. Sentado, agarrado ao guidão da minha bicicleta com o pensamento nem sei onde. De repente, bem na minha frente, uma senhora de pele cor de café, cabelos muito longos, jeans, jaqueta, bolsa, sandálias de salto. Bonita, jeitão alegre. Uma índia. Ao seu lado, uma moça com uma criança num carrinho. Não tinham qualquer ligação. Mas, encantada com o pequeno, a índia começou a brincar com ele, dizendo coisas, fazendo-o sorrir. Fiquei envolvido com aquela cena, acompanhando o seu jeito, seus braços fortes nos breves embalos no carrinho.  Logo, me veio na cabeça um romance que escrevi contando a história de um menino inocente diante da sabedoria de sua avó indígena. De súbito, a mulher lançou-me um olhar direto, como quem já sabia estar sendo observada.
Perguntou sorrindo:
- Para onde você viajou?
Fiquei apatetado com aquela abordagem inesperada. Olhei para a bicicleta e respondi:
- Ah... Eu fui pela ciclovia até o Leblon e...
- Não falo dessa viagem – cortou – Falo da viagem dentro da sua cabeça.
- Bem... Eu estava pensando numa história que eu escrevi.
- E nessa história tem criança?
- Tem sim.
- E se tiver uma avó índia, vou adorar – disse, sempre sorrindo.
Não quis confirmar. Seria inverossímil tanta coincidência. Achei aquele papo doido.
- Eu sou avó de muita gente – continuou – Tenho netos e mais netos de afinidade.
Eu não disse mais nada. Continuei a observá-la já sem disfarces.
Assim que a jovem mãe desembarcou com a criança, a curiosa senhora ficou quieta, cabeça baixa. Ela também tinha seus momentos de reflexão.
Quando o metrô chegou à estação Estácio, ela se levantou, ficou de costas. Pensei se não diria mais alguma coisa, se despediria. Pelo jeito, não. Porém, quando ela já ia dando seus primeiros passos para a porta, virou-se para mim sorrindo e disse:
- Felicidades pra você e para o seu livro.
Aquilo valeu por uma grande conversa.

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