A vizinha nas eleições
Eu,
inocente e pelado no quintal, e a vizinha me aparece na janela com o
olho esquerdo roxo, dizendo da sua impossibilidade de votar desta vez. Acha
gostoso votar, porém...
Justificou que, na noite anterior, foi ao boteco do portuga e encontrou-se, por acaso, com Pepe, um companheiro
da época de FUD (Feira de Utilidades Domésticas), que não via, fazia séculos. Depois de alguns chopinhos, o
antigo colega de vendas revelou animado estar candidato a vereador. Apesar de seu currículo pequeno, garantiu ter projeto bastante consistente que garantirá que seu mandato vá se alongando e apertou volumoso pacote com seu “santinho” para distribuir por aí. Depois, subiu na
cadeira, discursou, falou ser fiel a Deus, chamou o dono da casa de golpista... Por fim, convidou a antiga colega de trabalho para ir com
ele ao apartamento que adquirira no Minha Casa, Minha Vida em Jacarepaguá. Já
completamente bêbado e com o espírito de político ávido por meter a mão em cumbuca, sugeriu que exercessem a calorosa função cívica do debate democrático, prefeito no assunto, doido para depositar seu voto naquela urna. No tête-à-tête daquele confrontamento introdutório, ela tentou puxar pela memória alguma lembrança daquela antiga parceria, de como teria sido o desempenho dele durante o treinamento na função. Quando se lembrou, escutou do indivíduo ao seu ouvido a palavra "Casório". Ela recuou assustada e disse:
“Que papo de aranha falar disso agora! Quer me propor um caosório?”.
Irritado
com a recusa, o evangélico crivou-lhe uns tabefes, que a fez quase perder
um dente. Ela disparou porta a fora com o insano atrás, que ainda atirou umas pedras num grupo que passava carregando uma bandeira do
arco-íris.
A vizinha, dolorida, suspirosa, lamentando a votada
gostosa não dada, movimentou o maxilar para dizer:
“Foi melhor assim. O cara tem fraca instrumentação, é frouxo, molão, a agilidade de um VLT”.
Comentários