O namorado forrozeiro da Babalu

          Cheguei ao prédio da Rua Homem de Mello bem na hora marcada, com ideias que eu criara de logomarca para uma clínica de antiginástica. No balcão do hall de entrada, me deparei com um porteiro com ar intrigado, a analisar minha silhueta de chapéu panamá na cabeça e óculos escuros. Citei o número do apartamento e a moradora. Ele levou o interfone ao ouvido, mexeu num dos muitos botões de um aparelho de mesa e, enquanto esperava que atendessem, perguntou:
- O senhor é artista, não é?
- Sim. Por que?
- Saquei pela pinta. Reconheço de longe. Minha filha, na certa, lhe conhece, que aquela ali sabe tudo. Eu não vejo TV, não sei quem é quem. Como é o seu nome?
- Beto.
- Beto... Beto... – repetiu, como que tentando adivinhar – Beto de que?
Antes que eu completasse, a ligação foi atendida e minha subida autorizada. Agradeci e me enfiei depressa no elevador. No apartamento do décimo segundo andar, abri minha pasta e exibi as pranchas com meus desenhos. Minha cliente analisou um a um e sugeriu pequenas mudanças. Marcamos outro encontro e nos despedimos.
Ao embarcar de novo no elevador, dei de cara com duas mulheres bem parecidas. Trocamos cumprimentos. Mal a porta se fechou e iniciamos a descida, a que deduzi ser mãe da outra cochichou, mas de maneira audível:
- Olha só quem é! É ele! É ele sim!
- Será? – rebateu a jovem – Vou perguntar.
E virou-se para mim:
- Você é ator, não é?
- Não. Não sou não.
- Jura? Você não trabalha na novela das sete?
- Juro – respondi, achando graça - Não trabalho em novela alguma.
Elas se entreolharam risonhas e descrentes.
- Você é ator sim – afirmou a mais velha – Só não está querendo dizer.
- Desculpe, mas vocês estão me confundindo. Não sou quem estão pensando.
- Tudo bem. A gente vai fingir que acredita. Mas eu adorei aquela novela em que você fez o namorado da Babalu.
A conversa sem nexo foi interrompida com nossa chegada ao térreo. Dei passagem para as duas e já ia saindo também, quando o porteiro avisou:
- Dona Angela acaba de interfonar. É pro senhor subir de novo e pegar uma pasta.
De fato, eu havia esquecido as pranchas desenhadas. Deixei o trio embasbacado a fuxicar sobre minha simpática figura e voltei lá para cima. Quando retornei, de posse do meu material, as duas já não estavam mais por ali. Despedi-me do homem da portaria que, prontamente, acionou o portão eletrônico. Porém, ele não resistiu:
- O senhor pode me dar um autógrafo? Não é pra mim. É pra minha filha.
Sem paciência para argumentar, concordei. E assinei meu nome num pedaço de papel dedicado à Maíra. O sujeito ficou num estado de contentamento impressionante.
- Vou ligar pra ela agora - avisou.
Repeti meu “Até logo”, atravessei o jardim e o portão. Já do outro lado da rua, escutei os gritos do porteiro que saíra lá de dentro acelerado, celular na mão, só para dizer:
- Hei! Hei! Agora já sei! O senhor é o Falamansa! É o Falamansa! Valeu, Falamansa!
Levantei o dedo polegar confirmando e segui também contente.

Como é prazeroso o reconhecimento popular.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O gambá e a careca do papai

Beto e sua banda

Ata-me