O gambá e a careca do papai

Ainda na temática sobre bichos.
Outro dia, passeando pelo Forte do Leme, um grupo de cinco a seis micos vieram quase na minha mão, interessados em algo que eu pudesse lhes dar para comer. O hábito de alguns turistas em oferecer coisas os viciou. Mas esses bichinhos são umas graças mesmo, não? Em Santa Teresa, via muitos passeando pelos fios do bonde e eu ficava apreensivo. Alguns morriam eletrocutados. Muito triste quando isto acontecia.
Durante o tempo em que tive casa alugada em Lumiar, recebia visita de micos. Dava-lhes bananas e pedacinhos de pão pela janela. Pela manhã, como a casa não tinha forro e as paredes eram curtas, rolinhas invadiam meu espaço e sobrevoavam todos os cômodos. Durante o dia, em meus banhos no rio que corria nos fundos, eu costumava deitar-me numa pedra plana. Ali morava um lagartinho que acabou se acostumando comigo. Ficava parado, quieto ao meu lado. Meu companheiro na preguiça.
Só não gostava quando cobras apareciam. Entrava em pânico. Numa noite, batatas assando na fogueira, vinho, música, eu e uma amiga papeando. Ela sentiu algo frio passando por sobre seus pés descalços. Era uma cobra bem tranquila que seguiu seu caminho até sumir no escuro.  Outra vez, um amigo foi ao banheiro e, concentrado a mirar seu xixi no vaso sanitário, não percebeu a cobra toda enrolada deitada na janela, bem na altura da sua cabeça. Quando viu, deu um pulo para trás e ela chegou a dar o bote. Ele correu para fora, a calça aberta com tudo de fora a espalhar mijo por toda a parte. Chamamos um matuto do lugar para matá-la. Era imensa e venenosa.
Camundongos eram outros a me visitar. Um deles passou uma noite inteira naquele “roc, roc, roc”, roendo meu armário de roupas. De manhã, sem coragem de matá-lo, eu o encurralei com uma vassoura até conseguir que se enfiasse num saco grande de carvão. Corri e joguei o saco para o outro lado do rio. Ele saiu dali de dentro e ainda deu umas nadadinhas na maior alegria.
Fiz coisa parecida em Saquarema, ao me deparar com um filhote de gambá na varanda do meu quarto. Minha cachorrinha Milla quase tocou seu focinho nele que, assustado, mostrou os dentes. A gatinha Milu veio cheia de coragem. Tirei as duas de circulação e consegui que o bichinho entrasse num latão plástico de lixo. Fui até uma mata próxima e o soltei. Por um tempo, uma gambá com seus filhotes fez morada no forro da minha casa. Bichinhos inofensíveis.
Numa noite de sábado, eu entrava pelo salão do Clube 34 e vi o amigo Dudu Teles esparramado num dos sofás olhando para cima, sorriso nos lábios, um olhar sereno, perdido de quem está pensando nalguma paixão. De repente, a placa de isopor do teto, exatamente sobre seu rosto, se abriu e um gambá apareceu, quase caindo sobre ele. Ficaram cara a cara. Dudu levou um susto tremendo, se debateu horrorizado e saiu rolando pelo chão. O bicho ameaçou cair, mas se agarrou ao madeirame e sumiu pelo forro. Foi engraçado aquilo.
Mais engraçado foi o que aconteceu durante a assembleia de condomínio daquele clube, onde meu pai presidia a mesa. Muito falatório, muita gritaria, uma senhora bem gorda, conhecida pelo temperamento explosivo, a trocar ofensas com condômino também bom de briga. Enquanto os ânimos se exaltavam, pela janela do salão, Astor, um cachorro manto negro de uns amigos, era visto passando de cá para lá, de lá para cá farejando algo. Poucos perceberam, atentos aos desdobramentos da briga.
Meu pai, para conter aquele tumulto, levantou-se e gritou:
“Eu exijo ordem! Ordem! Ordem nesta assembleia!”
Deu a martelada na mesa.
E um gambá caiu do teto bem na careca dele.
Um fuzuê se instalou. O bicho saltou da careca para a mesa. Da mesa para o chão. Segundos depois, foi o cachorro Astor quem despencou lá do alto.
A gorda senhora, imediatamente, subiu na cadeira e gritou o que nunca tinha gritado antes na vida. Parecia um desenho da Disney. 
O gambá ziguezagueando pelas cadeiras, o cachorro tentando capturá-lo e o povo nervoso gritando e correndo. Foi hilário.
Por fim, o gambá escapuliu pela porta com cachorro atrás.

Trouxeram água com açúcar para a mulher, as pessoas rindo e comentando, todos se dispersando. A reunião se encerrou por ali e ninguém mais conseguia se lembrar dos motivos de tanta discussão.

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